contato@poderdanatureza.com.br

Mutilando nossa natureza

Mutilando nossa natureza

É isso o que fazemos quando tentamos adaptar nossa essência cíclica a um mundo linear: mutilamos nossa natureza.

Tudo no meio natural é cíclico: as estações do ano, o ciclo da água, o forma de vida das plantas, a cadeia alimentar, a reprodução, a degradação da matéria.

Nossa forma de estar no mundo também. Não só nossas células estão constantemente nascendo, crescendo, reproduzindo, envelhecendo e morrendo. Nossa psique também atua em ciclos. E até mesmo a forma como sentimos ou aprendemos se dá em ciclos.

Na Natureza não há linearidade quando observamos o desenvolvimento da vida com maior amplidão. Nem tampouco há estabilidade. A regra é o movimento e a transformação.

Mas, conforme nos afastamos do campo e nos adaptamos à rotina dos grandes centros, esquecemos desta característica tão básica. A convivência com a máquina, o produção em escala industrial, a acumulação do capital nos levaram a crer que a vida é linear e, mais do que isso, uma linha em eterno crescimento.

Num comportamento pouco racional para quem defende esta característica como motivo de dominação sobre as demais espécies animais, introjetamos a cobrança por linearidade e crescimento constante.

Desejamos ser sempre mais produtivos, mais criativos, mais informados, mais ricos, mais importantes, mais felizes, mais bonitos, cercados por mais amigos, acessando experiências cada vez mais intensas e prazerosas. Sempre mais, mais e mais… numa busca inconstante que nunca levará à completude, já que nossa natureza, enquanto humanos, é a da falta.

Em última instância, alimentando a fantasia de onipotência, queremos a todo custo nos afastar da morte.

Parece que a única coisa que não entra nessa lista para a maioria das pessoas é desejar SER MAIS. Parecer já é o suficiente.

Só que a morte é intrínseca a experiência da vida. Não há como negá-la, pulá-la ou delegá-la. Pelo menos não até agora. Podemos no máximo adiá-la, não sem que haja um custo, às vezes, altamente cobrado.

Respeitássemos mais nossos ciclos possivelmente nossa experiência na Terra seria menos sofrida para ela e para nós.

Mas o que incluiria uma vida mais condizente com essa realidade cíclica?

Podemos começar a pensar pelo mais básico: respeitar nosso ciclo de sono e vigília. Isso já ajudaria a manter nossa saúde, sobretudo mental com a liberação adequada de neurotransmissores que auxiliam em nosso bem-estar, diminuindo com a ajuda de outros hábitos a diminuição de incidência de ansiedade, depressão e bipolaridade.

Depois viria o respeito ao ciclo menstrual. Aqui as mulheres teriam o direito a distribuir suas tarefas profissionais e compromissos sociais de acordo com as necessidades de seu corpo e psique. Duas semanas, quando a energia está em alta, dedicadas a atividades expansivas – reuniões, venda, exercícios intensos, produção de vídeos para promoção de seus negócios, pesquisa externa – e duas semanas, quando a energia cai significativamente, mais introspectivas – usando sua criatividade para escrita, planejamento, meditação, introspecção, estudos. Nessa sociedade respeitosa, a mulher poderia até mesmo sangrar em paz em casa por alguns dias para recuperar a energia para o próximo ciclo.

Nossa alimentação também poderia respeitar os ciclos naturais, isto é, com maior consumo de alimentos da época, minimizando o uso de fertilizantes e agrotóxicos, degradando menos o solo, desperdiçando menos água, além de facilitar a digestão. Mas não, vamos ao extremo oposto, respeitando apenas o que é imposto pelo mercado: consumimos nozes, maionese, uva passa e uma matança de animais de várias espécies no Natal no verão de um país tropical.

Entenderíamos ainda que nenhuma felicidade é pra sempre, assim como nenhum sofrimento. Entender esse ciclo em nossas emoções e sentimentos poderia trazer mais conforto, autoconhecimento e empatia. Nos libertaria também para perceber que nossa identidade está em constante construção e que, até chegarmos próximo de nos tornarmos quem verdadeiramente somos, passaríamos por muitas mortes internas e das ilusões que compramos como verdade.

Por último, poderíamos pensar que nossos relacionamentos também são cíclicos e que passam por diversas transformações e mortes ao longo do tempo. Evitar olhar para isso deixa uma série de corações partidos, inclusive o nosso, ao longo da jornada, além de vínculos frágeis ou inexistentes.

O ciclo pode ser incômodo e até mesmo inconveniente à primeira vista. Mas colocar um círculo dentro de um quadrado quando seu raio é maior do que o lado deste só é possível cortando parte do primeiro.

Quais foram suas partes amputadas? A saúde física? A saúde mental? A profundidade nos seus relacionamentos? Sua sexualidade? O potencial presente na vivência da sua menstruação? Sua capacidade de aprendizado? A qualidade de vida no trabalho? Ou alguma outra parte que faz com que você se sinta eternamente em falta consigo mesma?

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *